



O xamã veste seu cocar e se põe à beira da cachoeira, soprando uma fumaça, elevando suas preces aos guardiões daquele lugar. O curandeiro busca compreender seus medos. Num instante, o céu tinge-se de Aurora, levando-o para a dimensão dos sonhos. O denso e o solúvel dançam entre si, e o sol, a lua e a estrela se envolvem no lapso de suas próprias mãos. Ele ouve o som primordial de sua essência, grave, profundo, visceral. Ele contempla a origem da vida - a grande explosão - em suas mãos, como em câmera lenta. Do seu sopro se faz vida. As pedras, guardiãs da sabedoria da Terra, da vida, da morte e do tempo, se elevam ouvindo o ritmo, o tom e a vibração. Da escuridão surge luz, e a fogueira revela a sua face de Onça, aquela que adentra a floresta em sua imensidão e não teme a si mesma, nem ao outro. Ela sabe como reproduzir cada movimento, por menor que seja. Ela é a cura encarnada em plasma, é quem sussurra o instinto do xamã, e ela mostra que os guardiões o acompanham a cada instante.




Há um imenso oceano, que convida a mergulhar as asas no infinito ancestral em busca das raízes da alma. Os passos e os frutos do que pulsa em nossa essência se conecta ao caos e a plenitude da existência, na sabedoria soprada nas galáxias de tempos infindáveis. Em nosso Elmo habita o passado, o presente e o futuro, e são uma coisa só. Nossa coroa de penas, flores, galhos e folhas é habitado por todo o fim, o meio e o começo. Em cada véu, a selva floresce e finda em uma espiral que ressoa o som soprado na fumaça, envolto em escamas que sobem e descem, e vão por todas as direções. Suas notas são luz, sombra e sangue - e o mistério há de ser tocado, ouvido e dançado. O tabaco é um mestre que merece ser ouvido e respeitado. Um pai poderoso, capaz de elevar nossas preces à manifestação. Uma erva de fogo, capaz de purificar, de proteger, de encorajar. Em algumas antigas tradições, ensinam que é desrespeitoso tragar sua fumaça, e que o primeiro sopro deve ser em si próprio, purificando a si. Depois então, sopra-se a fumaça para frente, oferecendo a fumaça aos seres de elevação espiritual, demonstrando respeito à consciência que ali habita.




TUPI-GUARANI
elementais
Ilustrações inspiradas em lendas populares dos guardiões das florestas, originárias dos povos tupi-guarani.


MATRIZ ORIGINAL EM NANQUM, 2017.
As raízes sempre quebrarão o concreto.
C a i p o r a é uma entidade indígena. Caapora em tupi-guarani significa Habitante do Mato. Protetora dos animais, seu espírito vive montado num porco-do-mato. Sua figura é intimamente relacionada com a vida da floresta. Ela fareja e ouve as intenções de quem penetra a densidade da mata.
Ela devora, enlouquece e desorienta quem vê abatendo animais sem respeito à fauna.
Uma entidade que vi em um sonho e, posteriormente, em um ritual na mata. Ela lembra que o mato sempre (r)existirá. As raízes sempre quebrarão o concreto.


MATRIZ ORIGINAL EM NANQUM, 2017.
Saci, s a c i - p e r e r ê, saci-cererê, matimpererê, matita perê, saci-saçurá ou saci-trique, é uma divindade tupi-guarani. Ele é guardião das ervas e das plantas medicinais. Sua função é o controle, sabedoria e manuseio de tudo que é relacionado às plantas medicinais, é guardião das sabedorias e técnicas de preparo e uso de chá, beberagens e outros medicamentos feitos a partir de plantas.
Como suas qualidades são as da farmacopeia, também é atribuído, a ele, o domínio das matas onde guarda estas ervas sagradas. Ele costuma atrapalhar e confundir as pessoas que não pedem a autorização para a coleta e utilização destas ervas. A lenda diz que os Sacis nascem em brotos de bambus, onde vivem sete anos e, após esse tempo, vivem mais setenta e sete para atentar a vida dos humanos e animais, depois morrem e viram um cogumelo ou uma orelha de pau.


MATRIZ ORIGINAL EM NANQUM, 2017.
Guardiã elemental, B o i t a t á, a protetora da mata. Lenda de origem indígena tupi-guarani, (boi) Cobra (tatá) de Fogo. Na narrativa, essa serpente pode se transformar num tronco em chamas para enganar e cegar destruidores e poluidores das matas, engolindo seus olhos e os enlouquecendo.


MATRIZ ORIGINAL EM NANQUM, 2017.
I a r a é uma homenagem à toda a vida das águas, aos elementais que mantém a biodiversidade, ao coração do planeta: a Amazônia e seus rios voadores, as águas doces e também o encontro com as águas salgadas. Corais, plânctons e todas as espécies aquáticas, seres inteligentes e complexos que infelizmente estão em extinção. Quanto custam os quilômetros de corais que levaram tantos séculos para serem formados?
Na lenda, Iara era uma indígena guerreira, filha de um pajé. Seus irmãos, com inveja de sua habilidade e beleza, começaram a perseguir e tentar matá-la. Como uma guerreira, ela se defendeu, os matou e fugiu. O seu pai descobriu que ela os havia matado, e a perseguiu. Quando a encontrou, a matou, jogando ela no rio. Os peixes e o povo das águas, admirados pela sua beleza, reviveram o corpo de Iara a transformando em metade mulher, metade peixe. O povo das águas e dos mares guardam todos os sons. Iara possui uma voz encantadora, capaz de hipnotizar os pescadores, os levando até o fundo dos rios e os afogando.